ARTIGOS Carlindo de Lira

CRISE DE PERCEPÇÃO: “Não pergunte por quem o sino dobra, ele dobra por você”
Por Carlindo de Lira* (publicado em 19/04/2014)

É reconhecido academicamente que o conhecimento é um ato cognitivo de construção coletiva, bem como este representa uma formação ideológica no sentido de representar os interesses de uma classe socioe-conômica dominante num determinado momento histórico, que toma posse poder político do estado, do capital financeiro e humano, que viabiliza a produtividade numa dada sociedade e, ainda, controla o capital intelectual produzido nesse contexto, pois é esse capital que vai nortear a visão de mundo de certa sociedade, sendo transmitida pela educação instituída legalmente e num sentido amplo e sistematizado.

Há mais de trezentos anos surge o pensamento positivo, assim, denominado pelo pensador francês Augusto Comte, para diferenciar o modo de abordar e compreender a realidade, que se constitui de uma metodologia específica, sistematização de dados e procedimentos químicos em laboratório, tudo fundamentado no pensamento filosófico analítico de outro francês René Descartes, que vai se concretizar como experimentos científicos na metodologia aplicada por Isaac Newton, físico inglês, que inaugura o fazer científico em sua cosmovisão clássica do fazer científico.

Foi esse procedimento metodológico que orientou por três séculos o projeto científico do mundo moderno. Esse modus operandi vem formando por séculos as cabeças pensantes do ambiente acadêmico nas universidades ocidentais e posteriormente orientais.

É inegável que essa abordagem científica contribuiu com o surgimento da Revolução industrial, com a prática moderna da medicina, com a produção de remédios eficientíssimos, com o surgimento da tecnologia com aplicação em todos os setores da atividade social, com a produção de aeronaves e a viagem espacial, etc.

René Descartes concebera o universo como uma máquina cujas peças ajustavam-se perfeitamente uma a outra como a de um relógio analógico e, por isso, para entender a funcionalidade dessa máquina fazia-se necessário fragmentá-la em pequenas peças, como em um quebra-cabeça, e como tal o pensamento analítico, que divide o inteiro em partes menores para entendê-lo foi o modelo mais adequado e prático para seu funcionamento.

Com esse modelo em mente, a medicina dividiu o corpo humano em partes cada vez menores para ser entendido e tratado em suas partes danificadas. Descartes, afirma em sua obra que corpo e mente são entidades separadas, bem como a funcionalidade da natureza no planeta não tinha nenhuma relação com o ser humano.

Deu-se início a exploração dos recursos naturais de maneira indiscriminada, descuidada e irresponsável; tudo em nome do progresso: não importa se poluindo rios, mares, fazendo queimadas e desmatando florestas virgens, ou ainda, se polui o ar das grandes cidades onde moram milhões de trabalhadores e trabalhadoras.

Esse modelo de fazer a economia dos países crescerem e manter mercados financeiros aquecidos, foi construído socialmente e perpetuado pela informação e pelo conhecimento transmitidos pelos aparelhos ideológicos do Estado, conforme defende Louis Althusser: a instituição escolar, jurídica, política, religiosa e meios de comunicação de massa.

Ao produzir um modelo cognoscente de fazer ciência consolidou-se socialmente uma maneira de perceber e entender o funcionamento do planeta terra e nossa relação com ele, bem como, de conceber o corpo humano, o viver das pessoas e a existência humana na terra.

É com esse modelo analógico em nosso pensamento, que sempre que temos a necessidade de compreender algo ou alguém aplicamos inconscientemente o modelo cartesiano de analisar pessoas e o mundo: retiramos o ser analisável do seu contexto e ao separá-lo, esfacela-se e disseca-se o ser inteiro em partes cada vez menores até satisfazer nossa necessidade momentânea de saber e conhecer.

O renomado físico inglês, denominado pai da ciência moderna, Isaac Newton deu o golpe final demonstrando que a Lei da gravitação Universal e as Leis da Física Clássica atuam de modo neutro sem qualquer interferência da vontade ou percepção humana. Ou seja, a vida humana na terra não tinha nenhuma relação com o movimento dos astros no céu: o sol, os planetas e a lua são o que são sem qualquer relação com a vida humana na terra.

Surge, assim, um modelo mais amplo e cientificamente comprovado na época, que as ciências da natureza e suas leis da física, bem como a matemática são um tipo de conhecimento existente por si, exato e neutro em relação à percepção e vida humana na terra, esse tipo de conhecimento científico existe separado de nosso contexto e condição humana telúrica.

Por três séculos essa maneira de fazer e ver a vida fundamentou os currículos escolares da Europa, das Américas e, especificamente do Brasil. Porém, no início do século XX, pesquisadores como Albert Enstein, Max Planck, Heisenberg, Niels Bohr, Schrödinger, Edward Lorenz, na área das ciências da natureza; já Sigmund Freud, Carl Gustav Yung, Schopenhauer, Émile Durkheim, Max Weber, Karl Marx, nas ciências sociais; ainda Kierkegaard, Stirner, Nietzsche, William James, John Dewey, Decroly, Montessori, Freinet, Anisio Teixeira, Lourenço Filho e Paulo Freire pensadores e pedagogos consecutivamente, para citar somente alguns nomes, que influenciaram de maneira notória o século XX e, com isso, impulsionaram o fazer e o compreender da condição humana na terra.

A Física apresenta-nos a Teoria quântica que vem contribuindo e ampliando consideravelmente a maneira como o ser humano constrói conhecimento por meio de sua inevitável e indispensável participação no nível eletrônico das partículas que constituem o alicerce de como as coisas se apresentam em nosso mundo, como consciência que observa e por meio dessa observação-participante interage criativamente na construção da realidade, não mais de maneira separada e neutra como no modelo newtoniano, pois, na explicação de Schödinger passa do estado de existir como ondas de possibilidades, coagulando para o estado de partícula tornando concreta uma dentre as várias possibilidades de vir a ser a realidade, assim, o observador escolhe no nível subatômico, de maneira participativa e invisível uma entre as possibilidades de vir a ser da natureza, muito além do modelo de separação e neutralidade humana defendido por Isaac Newton em sua Física Clássica vigente em todo o século XX e início do XXI.

Contudo, ao iniciarmos o século XXI, ouve-se o tinir do sino fazendo o chamamento para o momento de reflexão, que na afirmação do estadista norte-americano Thomas Jefferson: “é tola a sociedade que se apega a velhas ideias para resolver problemas novos, assim como é tolo o adulto que tenta vestir suas roupas de criança”. Logo, percebe-se que o século XXI não representa apenas um momento histórico de entender o progresso de modo quantitativo e numérico, mas acima de tudo trata-se de um século que potencializa um salto de sentido qualitativo nas bases da compreensão da produção do conhecimento, que vai fundamentar nossa percepção com relação a nossa participação na natureza e na sociedade.

Como tem afirmado o físico Fritjov Capra “Nós não evoluímos no mundo, mas com o mundo”, e acrescenta a Doutora Danah Zohar: “trazemos nosso ser e nosso mundo à existência por intermédio de uma resposta criativa, face ao mundo e face ao outro”.

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ANALFABETISMO POLÍTICO: quanto custa ao bolso do povo alagoano
Por Carlindo de Lira*, publicado em 01/04/2014.

O conhecido dramaturgo e pensador alemão Bertold Brecht cunhou a expressão “analfabetismo político” num de seus textos, sempre marcados pela profundidade e contextualização temática.

No universo acadêmico eram conhecidas as expressões “analfabetismo”, semianalfabeto, analfabetismo puro, analfabetismo funcional. Mas, “analfabetismo político” na acepção usada pelo dramaturgo, soou, sem dúvida, como algo inovador, semanticamente, discursivamente conduzindo-nos à reflexão seu amplo significado histórico: o analfabeto político não sabe que de sua escolha depende o preço da água que bebe, do feijão que come, da roupa que veste, do sapato que usa, dos serviços de educação, saúde e segurança;

Diz Brecht: “( … )não sabe que de sua ignorância política nasce o menor abandonado, a miséria social, e o pior de todos os bandidos sociais, o político corrupto, lacaio das empresas nacionais e multinacionais”.

Ao mencionarmos a expressão analfabetismo vem-nos à mente os indicadores sociais como Índice de Desenvolvimento Humano, Índice de Gini, e outros, calcados pelo subdesenvolvimento dos países capitalistas, e pelo totalitarismo de países que tentaram adotar o modelo político comunista; porém, a expressão “analfabetismo político” tem um alcance e penetração, quase universal, em todos os sistemas políticos, quer em países centrais ou periféricos.

A história tem registrado que a apatia popular, quanto a sua participação “consciente e crítica”, no processo político é determinante para a ocorrência de fenômenos político-sociais como, a recessão e a depressão econômica, abuso de poder nas esferas religiosas e governamentais, golpes militares, práticas políticas discriminatórias, convulsões sociais e guerras.

Verifica-se que o “analfabetismo político” à moda bertoldiana, conduz qualquer sociedade, seja qual for o contexto socioeconômico, a medidas que assumem proporções dramaticamente desastrosas, quer estejamos falando do contexto alemão para o surgimento do Nazismo Hitleriano e suas consequências hediondas, ou do Imperialismo Neoliberal desumano, norte-americano, e o Efeito Bush, ainda, na atual crise econômica mundial; no caso americano, tudo tem início na esfera política, na apatia do eleitorado estadunidense, ou seja, apesar de estarem no primeiro escalão da economia mundial, sendo o modelo de desenvolvimento, o cidadão norte-americano apresenta, inquestionavelmente alto índice de “analfabetismo político”, isto é, ausência de participação e ou tomada de consciência crítica, que gera, em todas as sociedades, as mazelas sociais sintomáticas, elencadas acima.

Já, não é hora de nos perguntarmos qual o prejuízo ou dano social para um município, estado ou país, como consequência do analfabetismo político de sua população.

O que nos remete à pergunta, quantos prejuízos ou mazelas sociais tem causado o “analfabetismo político” nos 102 (cento e dois) municípios do estado de Alagoas? Por ignorarem que de suas escolhas políticas os 102 (cento e dois) municípios alagoanos, mergulhados em dívidas e corrupção, não melhoram seus Índices: de mortalidade infantil, de oportunidade de formação escolar, de renda per capita (por indivíduo), de inclusão nos benefícios sociais.

Segundo os institutos de pesquisa nacionais e internacionais, mais da metade da população alagoana vive com menos de um salário mínimo,isto é, estão abaixo do nível da pobreza.

Contra os fatos não há argumento, diz um ditado romano. Há quem diga, por via de um discurso alienado e alienante, que “é da vontade de Deus”, fala oriunda da ignorância política! Contudo, os responsáveis por Políticas Públicas que podem melhorar a curto praso tão alto índice de exclusão social, e a médio e à longo prazo solucioná-lo de vez, são os políticos escolhidos pelo voto dessa população de excluídos, que, deve-se frisar, não está preparada sequer para fiscalizar os rumos do Orçamento Público.

Mas, se os políticos alagoanos, vereadores, prefeitos e vice, deputados estaduais, governador e vice, deputados federais, senadores e seus suplentes, que constituem a bancada alagoana nas esferas legislativas e administrativa, têm o poder para atuar politicamente ‘representando’ as necessidades da população pobre, cabe afirmar que, quem os colocou nessa condição política foi o Voto na Urna desse mesmo povo excluído.

Cabe aqui, indagar, quanto custa à vida do povo de Alagoas seu “analfabetismo político”. Quanto custa escolher, erradamente, vários políticos que não estão representando na Câmara de Vereadores, na Assembleia Legislativa, na Câmara Federal e no Senado, as reais necessidades do povo pobre ou que sobrevive abaixo da linha da pobreza, de onde vem a maioria dos votos. É oportuno fazer algumas perguntas: Onde estão os políticos eleitos por essa massa que sofre pela falta de emprego e renda diariamente… Onde estão os representantes eleitos por esse povo que os vê como portadores da solução para os suas mazelas… Onde estão seus Projetos para esse povo que o elegeu… Será que esse povo pobre das Alagoas sabe o que fez com o seu voto…

O dramaturgo alemão, talvez, tenha razão, entre todos os analfabetos, o pior deles é o “analfabeto político”, pois ignora que de sua decisão, ao escolher políticos descomprometidos com a sua história de vida, “ vai provar do pão que o diabo amassou”; e quanto a Deus, Ele já deixou o Livre Arbítrio para todos nós, isto é, o Poder de Escolha é do Povo e as consequências, também; sejamos honestos, deixemo-Lo fora de nossas Escolhas Políticas, estas são o resultado de nossa “Formação Política” ou de nosso “Analfabetismo Político”. Cabe indagar: Queremos o “analfabetismo ou Formação Política”… E ainda, qual o custo histórico imediato e à longo prazo do “Analfabetismo Político” na vida dos alagoanos.
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Síndrome de Bournout Docente: doença do século XX
Por Carlindo de Lira* (publicado em 17/03/2014)

A pesquisa e a literatura sobre a saúde do professor vêm crescendo e interessando cada vez mais aos profissionais da educação, que por sua vez, têm entendido que sozinhos não dão conta das situações de desequilíbrio do ambiente social ao qual estão expostos na escola, conforme Abreu et al (2002): “o Burnout é o resultado de um prolongado processo de tentativas de lidar com determinadas condições de stress”, por isso, buscam, com mais frequência, ajuda de especialistas em saúde mental, psicólogos e psiquiatras.

O verbete Burnout é um neologismo criado a partir de duas palavras inglesas burn e out, que tem o significado literal em inglês ‘aquele estado de limite em que algo parou’, ou ainda, ‘em que algo se acabou por total falta de energia’, também, ‘tornou-se inoperante pelo excesso de uso, bem como, significa coloquialmente ‘a destruição causada pelo uso contínuo de drogas’. Encontra-se, ainda, os significados de ‘uma chama de vela que se apagou’, ‘o indivíduo que tomou todas’, e, por fim, uma lâmpada queimada causada por um curto-circuito’; pode-se, assim, verificar esses empregos dessa termo em língua inglesa.

Nesse artigo o termo Burnout terá o significado utilizado metaforicamente na psicologia, conforme Benevides-Pereira (2010) “(…) que expressa o esgotamento físico, mental e emocional do trabalhador em função do labor que vem desempenhando”. É sob este enfoque que a pesquisa in loco vai desnudar as causas mais significativas que vêm atuando negativamente no desempenho dos profissionais da educação, que exercem atividades em sala de aula.

Nesse sentido, afirma Bauman: “A saúde mental, na atualidade, não pode ser estudada significativamente como uma qualidade abstrata de seres abstratos”. Nessa perspectiva, essa pesquisa, busca identificar e registrar por meio de dados estatísticos, as evidências das manifestações da Síndrome de Burnout em um grupo de professores atuantes no ensino fundamental e médio da rede estadual do estado de Alagoas-BR, objetivando detectar o modo de vir a ser dessa síndrome e, assim, disponibilizar à comunidade acadêmica e à sociedade em geral informações elucidativas por meio de dados coletados em questionário específico (MBI – Maslach Burnout Inventory), sobre a manifestação dessa síndrome que tem prejudicado o desempenho de professores no magistério alagoano.

No mundo contemporâneo as relações no ambiente de trabalho atingiram um ritmo nunca visto antes na história das sociedades humanas, os desdobramentos de uma rotina de contatos diários e repetitivos no trato com a clientela tem intensificado certos tipos de comportamentos, bem como, tem sobrecarregado emocionalmente o trabalhador em uma intensidade jamais vista.

Em relação a esse novo contexto afirma o sociólogo polonês, considerado pai da pós-modernidade, “Nessas instituições, quadros de referência, estilos de vida, crenças e convicções mudam antes que tenham tempo de se solidificar em costumes, hábitos e verdades autoevidentes” (BAUMAN, 2003). Esse recém-chegado ambiente nas novas relações trabalhistas faz surgir, acompanhado desse novo frenesi relacional, novas formas de adoecer e entre elas está a Síndrome de Burnout.

O Burnout apresenta-se, então, como modo de adoecer culturalmente adquirido, em resposta a uma maneira socialmente imposta pelo modelo de desenvolvimento alavancado pelo mo-dus operandi das instituições empresarias, as indústrias de transformação ou, ainda, pelo emergente setor de prestação de serviços, onde tem se verificado maior incidência dos sinais e sintomas dessa síndrome.

Nesse sentido, “a necessidade de trabalhar, de pontualidade e ordem teve de ser trans-formada em impulso interior para que a sociedade industrial funcionasse. Isto quer dizer que a sociedade teve de produzir um caráter social ao qual tais impulsos fossem inerentes” (FROMM,1995.p. 25). Desse modo, status quo imposto pela atual organização social é fator ge-rador de novos modos de adoecer do trabalhador urbano.

Concebida, assim, a Síndrome de Burnout apresenta-se no cotidiano escolar brasileiro, e mais especificamente entre os docentes alagoanos como indício de que alguma coisa está mal nas relações de trabalho no ambiente educacional e urge que algo precisa ser feito para minimizar as consequências danosas já descritas por teóricos da psicologia como em “O mal estar na civilização”, Freud afirma que, “o convívio humano impõe sacrifícios e renúncias, que geram mal estar e infelicidade” (FREUD, 1931).

Nessa perspectiva, estudar e investigar sobre a temática proposta é importante por desnudar aos olhos da comunidade acadêmica e dos trabalhadores em geral, que se faz necessário conhecer os sinais e sintomas da Síndrome de Burnout, bem como seus agentes causadores e também, suas fases e tratamentos possíveis no encaminhamento clínico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Lago, Kennyston. Fadiga por compaixão: o sofrimento dos profissionais da saúde /KenystonLago, Wanderley Codo. Petropolis, RJ : Vozes, 2010.
Machado, Jorge. Saude e trabalho no Brasil : uma revolução silenciosa : o Ntep e a Previdência Social / Jorge Machado, Lucia Soratto, Wanderley Codo (orgs.). Petropolis,RJ : Vozes, 2010.
Tardif, Maurice. O trabalho docente : elementos para uma teoria da docência como profissão de interações humanas / Maurice Tardif, Claude Lessard, tradução de João Batista Kreuch. 6. Ed. Petropolis, RJ : Vozes, 2011.
Levy, Gisele Cristine Tenorio de Machado. A síndrome de Burnout em Professores do ensino regular : pesquisa, reflexões e enfrentamento / Gisele Cristine tenorio de Machado Levy, Francisco de Paula Nunes Sobrinho (orgs.). RJ : Cognitiva, 2010.
Silva, Paulo Sergio. A saúde mental do Professor. Paulo Sergio Silva. São Paulo : Expressão e Arte Editora, Edifieo, 2006.

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GERAÇÃO PENSAMENTO VERSUS GERAÇÃO ACÉFALA – Por Carlindo de Lira*

Nasci na década de sessenta, mais precisamente no ano de 1964, aqui no Brasil o ano do Golpe militar que impôs a lei do silêncio a imprensa através da censura, que amordaçou a boca de toda uma geração de jovens, forjados nas décadas anteriores, que foram treinados para pensar o Brasil de seus ideais, o país de seus sonhos mais caros.

Na educação, jovens educadores como Anísio Teixeira e Paulo Freire tiveram que correr às pressas para as embaixadas de países estrangeiros em busca de asilo político. Na música jovens como Caetano Veloso e Gilberto Gil, só para citar dois mais conhecidos que tiveram que se ausentar dos palcos; e também foram forçados a expatriar-se artistas, religiosos, e principalmente, jovens militantes da política partidária da época ou simpatizantes de ideologias autenticamente democráticas, libertárias, socialistas e comunistas.

Toda essa força intelectual nascida no berço esplêndido da pátria amada Brasil, no fulgor de seu ímpeto juvenil, quando estão mais aptos a darem sua contribuição cidadã ao seu país, é empurrada violentamente para fora da comunidade brasileira pela Ditadura Militar, intelectualmente acéfala, guiada e sustentada por uma elite de ideologia neoliberal, capitalista nacional e transnacional, inglesa e norte-americana, conta hoje a história.

Essa fuga de cérebros exilados, somada ao enclausuramento institucional, das forças progressistas sociais tais como a ordem dos advogados, os sindicatos, as universidades, as igrejas, as associações de profissionais como jornalistas; o silenciamento dos movimentos sociais, como estudantis, da terra ou agrário, das minorias, como dos negros e das mulheres e das crianças no Brasil, conduziu nossa sociedade a um esvazia- mento sócio-cultural, a um empobrecimento de valores humanos sem precedentes na nossa história.

Os militares brasileiros, sedentos de poder, a ser distribuído pela elite econômica, praticaram um dos piores crimes contra seu povo e seu país, constata-se agora: deixaram-nos órfãos! Dizimaram toda uma geração de pensadores-filósofos, artistas, pensadores-políticos; perseguiram escritores, calaram a voz dos que por terem pensado o Brasil, tinham algo a dizer às novas gerações.

Em vinte anos de Ditadura Militar virulenta, adoeceu a nova geração da classe pobre e dos milhões que sobrevivem abaixo da linha da pobreza, mergulhou essa geração numa oligofrenia secular, esses jovens, hoje, não sabem pensar, refletir, porque foram impedidos de alimentar-se dos frutos do pensamento dos pais da intelectualidade brasileira; sofrem de anorexia do saber, são anoréxicos da intelectualidade.

É essa doença crônica, de fácil diagnósticos, porém de difícil remediação e que raramente encontrará cura; em muitos casos morrem de fraqueza intelectual sem uma qualificação que habilite sua força de trabalho, causada pela ausência de alimento intelectual adequado, e em outros, mais dramáticos olham-se no espelho da história e não conseguem ver o óbvio, não enxergam seu corpo intelectual magérrimo, esquelético, cadavérico!

Este é o custo social da ausência de políticas públicas na área educacional, habitacional e agrária para o povo brasileiro, promovido pela elite econômica brasileira, financiadora da Ditadura Militar, que mandava e manda seus filhos estudarem na Europa e nos EUA, com nosso dinheiro, nas melhores escolas e Universidades de pensamento e formação estrangeiros para retornarem, alienado Doutores, o mito do meu filho doutor, título de cunho sócio-econômico discriminatório na sociedade brasileira; tudo ao contra- rio do que queriam e pensaram nossos “cérebros exilados”; em detrimento das péssimas condições de vida da gente brasileira: milhões de analfabetos foram impedidos de estudar e qualificar-se; milhões sem teto pagam aluguel ou moram na rua; milhões sem terra vítimas do êxodo rural; essa é a tragédia brasileira em pleno século XXI, que tem como promotores a elite neoliberal econômica nacional e estrangeira.

Ao longo dessas duas décadas de Ditadura Militar, essas elites, patrocinaram uma desconstrução do pensamento brasileiro que emergia na esfera política, nos círculos culturais, nos movimentos populares, nos movimentos estudantis e Universitários. Com capital brasileiro financiou a democracia norte-americana, as Universidades européias, pagando vultosas somas para seus filhos privilegiados estudarem lá. Como a Tiradentes, esquartejaram o corpo popular brasileiro, deceparam as cabeças pensantes do resto do seu corpo. Pensaram: ‘vamos repetir o mesmo feito’, e assim, realizaram um esquartejamento social, demográfico, humano.

Mais uma vez, essa elite foi bem sucedi- da em seu intento. É uma elite de uma força bestial e inconseqüente, pois tem produzido quadros terríveis na maltratada gente brasileira, cruelmente submetida às piores condições de vida que se pode registrar em escala mundial, tendo em vista os dados dos institutos de pesquisa brasileiros e organismos e instituições internacionais como o índice GINE, e a ONU, que apontam para o baixo Índice de Desenvolvimento Humano da gente brasileira com números alarmantes de mortalidade infantil, de enormes contingentes humanos sobrevivendo abaixo da linha da pobreza, portanto, vivendo em condições subumanas causadas por políticas calcadas na marginalização e exclusão social.

Essa herança maldita tem que ser enfrentada com igual ou maior poder de força, por meio de Políticas Públicas como planos de governo, projetos nos ministérios, programas e ações a serem desenvolvidas pelas secretarias nas instâncias federais, estaduais e municipais em parceria suprapartidária. Tudo isso deve vir associado aos movimentos sociais, estudantis, de classes trabalhistas, sindicais e religiosa.

Somente com a articulação desses segmentos torna-se possível agregar forças libertárias suficientes para superar o desmantelamento da gente brasileira promovido pela elite econômica, que não podemos esquecer, continua aí, promovendo mal-estar social através dos instrumentos de que podem lançar mão, tal como os meios de comunicação social, rádio, tevê, internet, jornais impressos e eletrônicos, revista e outros.

Além de usarem o capital privado para usurpar do povo despreparado o pouco que tem, como no caso dos juros criminosos dos cartões de crédito, dos empréstimos bancários aos aposentados por instituições financeiras, que atuam ferozmente por onde passam. É a elite econômica neoliberal e seu antigo poder bestial, vestida com pele de cordeiro, a nos desafiar: “decifra-me ou te devoro”!

[ Fonte: ? ]
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Onde está o Estado de Alagoas? / Esta pergunta, a princípio parece não fazer sentido – Por Carlindo de Lira*

Ora, geograficamente todos pensam saber que nosso estado está localizado na região nordeste do Brasil, é óbvio! Logo, por este ângulo o Estado é o seu território com suas diversidades de solo, flora, fauna e clima.

Os Alagoanos conhecem, ou já ouviram falar das belas praias, do rio São Francisco, das lagoas Mundaú e Manguaba. Mas… Se volvermos nossa mente para o passado vamos constatar que toda essa realidade geográfica já estava aqui, bem antes da separação geopolítica da Capitania de Pernambuco.

Então, se Alagoas não surgiu por força de seus recursos naturais, o que faz, afinal, uma porção de terra ser transmutado em um Estado? Recoramos ao Professor Elcir Castello Branco que em seu livro intitulado Teoria geral do Estado cita uma definição de Estado do Bluntschli:

“O Estado é o conjunto de homens compondo uma pessoa orgânica moral sobre um dado território, na forma de governantes e governados (…)”. Começamos a perceber que o conceito de estado está diretamente associado ao ser humano, ao agrupamento, à vida em sociedade. Afirma Jellinek “o Estado é a corporação fundada por um povo, dotada de um poder de mando originário e assentada em determinado território”.

Dando um ordenamento jurídico Dallari conceitua: “Estado é uma ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo, situado em um determinado territó-rio”. Neste conceito podemos ver claramente a concretização da tradição normativa para o convívio humano, e a consolidação do valor humano ao declarar-se o ‘ter por fim o bem comum de um povo’.

O Professor Elcir, no entanto, mais adiante no seu livro conclui: “Na definição do Estado não são essenciais os dados de relação entre os indivíduos, como dominantes e dominados nem a finalidade, ou vocação para o bem comum. Nem sempre o Estado busca o bem comum a exemplo de certas tiranias, que não deixam de ser Estado”.

É fácil entender da declaração acima, que juridicamente as leis propostas e aprovadas por aqueles que ocupam o poder de mando num dado território, podem atender tão somente aos interesses e valores de um grupo, em detrimento dos interesses e valores da coletividade.

Retomando a discussão inicial, onde está o Estado de Alagoas? Vemos, agora, com mais clareza que um Estado é uma Construção coletiva, ou Criação do conjunto de um povo. O Estado é a Cultura, a Tradição, os Valores, que numa sociedade apresenta-se como um agregado de leis e normas historicamente consolidadas pelo poder que uma determinada classe social tem, temporariamente, sobre outra.

Portanto, o estado de Alagoas está onde a vontade coletiva de seu povo decida onde ele deva estar. A estrutura de um Estado Democrático Contemporâneo não admite mais posturas tirânicas do grupo que foi conduzido, por um processo eleitoral, ao governo. O povo, agora sabe que o seu papel é determinante no rumo que as leis devem tomar.

Não se admite mais administrar por decretos leis, que atropelem Leis, já aprovadas pelo Poder Legislativo eleito pela vontade popular, ou por elaboração de leis que desrespeitem seu povo.

[ Fonte:? ]

* Carlindo de Lira é professor da UNEAL e acadêmico da ACALA.

Fonte (link): http://www.portal96.com/v4/colunista/carlindo-de-lira/21/#geracao-pensamento-versus-geracao-acefala

[ Editado por Pedro Jorge / E-mail: pjorge-65@hotmail.com ]

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